Percebi que atualmente a sociedade não permite o sofrimento. A ideia difundida é de que sempre teremos que ser felizes e superar as coisas rapidamente, mas a realidade não é essa. Essa imposição dos tempos modernos talvez seja a causadora de tanta angústia nas pessoas. A dor faz parte da existência humana e muitas vezes só conseguimos sair dela quando assumimos a sua presença sem máscaras ou subterfúgios.
Meus últimos dois anos foram bem complicados. Sendo que os últimos dois meses foram especialmente difíceis, pois meu pai faleceu, meu trabalho alcançou o auge do estresse e a minha FIV deu negativo após duas induções, detalhe sem embriões excedentes para congelar.
Nesse tumulto todo senti uma tristeza profunda e as pessoas começaram a sufocar-me com palavras vazias e algumas vezes frias. Percebi que algumas colocações embora revestidas como um consolo foram proferidas para magoar-me, fora as insinuações de que eu estava sofrendo à toa ou fazendo drama.
Poucas pessoas têm conhecimento de que estou fazendo tratamento para engravidar e mesmo assim escutei tanta coisa patética absurda. O que mais ouvi foi: "Cuidado para isso não atrapalhar o seu casamento ou trabalho", "Faz parte", "Por que não relaxa", "Existe coisa pior"... É muito fácil falar essas coisas quando a própria vida deu certo. Quando essas pessoas estão com seus filhos e não tiveram suas expectativas frustradas por "anos a fio", seu corpo sobrecarregado de remédios e sua mente dominada pelo medo, pela ansiedade e pela angústia. Um dia desses perguntei para minha médica como ela se sentiria caso não pudesse ter tido os três filhos que tanto ama. Pedi para que imaginasse como seria se aquele dia em que decidiu engravidar estivesse se perpetuando até hoje sem sucesso. Na hora que escutou isso ela olhou para mim com a cara assustada e disse que nem conseguia imaginar como seria passar por isso. Pois é, o problema está na incapacidade que a maioria das pessoas tem de se colocar no lugar do outro. Fora que algumas se esqueceram que são humanas e que um dia precisarão da compreensão e da compaixão do outro, pois de uma forma ou de outra a dor invariavelmente chega para todos. Como já disse em outros posts, para alguns ter filhos é o maior projeto/sonho de vida. O impacto emocional de passar anos em busca da fertilidade é o mesmo de uma doença.
E nesse contexto me permiti sentir a dor como ela era, passei um mês e meio vendo a vida bem preta, fazendo só o necessário.
Refleti muito, e como o tempo não para e não tenho a menor vocação para ser vítima ou para perder as rédeas da minha existência comecei a procurar caminhos para recomeçar a minha vida como um todo. Voltei a malhar, a frequentar o centro espírita e a fazer leituras edificantes. Como estava ficando doente na loucura profissional em que estava inserida eu formalizei meu pedido de transferência de setor, afinal sempre fui uma ótima profissional e tinha essa prerrogativa, não podia continuar esperando ajuda de uma chefia que não se importava. Marquei retorno no meu médico para traçar uma nova estratégia para recomeçar a FIV. Comprei dois ótimos produtos da skincelticals "prevent" para passar no rosto, um durante o dia e outro à noite. Marquei salão para cuidar dos cabelos e comecei a tomar vitaminas e geléia real para os óvulos.
E assim comecei a escalar a parede do poço no qual havia caído com a cara no chão. Confesso que em alguns momentos as coisas ainda estão cinzas, mas já estou bem melhor, graças a Deus!
E tudo isso só foi possível porque me permiti sofrer de verdade e a partir daí ter uma nova consciência sobre mim mesma.
Nós fivetes somos mulheres muito corajosas e guerreiras e não podemos nos esquecer disso.
Então, digo:
Sim, é permitido sofrer sem culpa e sem medo para só depois seguir em frente.